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(546) TEXTO: A BORRACHARIA - AUTOR MARIO PRATA



"APAIXONE-SE PELA MATÉRIA QUE LECIONA. A EMPOLGAÇÃO É CONTAGIANTE."
 KAREN KATAFIASZ

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Tudo evolui no Brasil. Menos a borracharia. Já notou? São exatamente iguais as borracharias da nossa infância, quando íamos lá com nossos pais. Inclusive os borracheiros parecem ser os mesmos. Parecem feitos de borracha, não envelhecem.
Há algumas décadas não devem mais nascer garotos que dizem: vou ser borracheiro quando crescer. Para cada borracharia existem dois borracheiros. Um mais velho (que é para quem você vai pagar no final do serviço) e o mais jovem (que é quem pega no duro).
Duvido que alguém já viu uma borracharia limpa. Para ser uma boa borracharia ela deve ser imunda. Não é suja, é imunda mesmo. Assim como os borracheiros. Eles não lavam as calças e as camisetas há séculos.
Não há lugar para se sentar. Jamais. Você tem que ficar em pé esperando o serviço. E acompanhando atentamente.
A coisa começa na porrada, literalmente. Um super-martelo e o cara bate pra valer no nosso pneu para tirar a câmera de ar e, com uma alavanca vai girando o pé com uma maestria invejável. E tira para fora aquela coisa mole, cinza, morta. E furada.
Todas as borracharias têm a sua banheira, é claro. Uma banheira que um dia – imagino – foi branca. Se você quer saber a cor de um burro quando foge, é aquela ali. Entre cinza e marrom. E a água onde vai ser enfiada a câmera de ar? Que cor é aquela? E onde foi que o sujeito arrumou a banheira? Comprou especialmente para aquele serviço, aquela serventia? Mas é eficiente. Logo vemos as bolhinhas de ar subindo pelo furo. O borracheiro coloca o dedo no furinho e te olha. Apenas olha. Todo mundo entende aquele olhar.
Neste momento eu pergunto: os pneus já existem há mais de cem anos. Ninguém se deu ao trabalho de inventar uma outra engenhoca para descobrir onde fica o furo?
Aí ele saiu pingando com a nossa câmera de ar pelo chão, notadamente nos nossos sapatos. Enxuga. Coloca numa máquina de tortura, passa uma cola e junto um pedacinho de borracha. Comprime aquilo. Chega a doer. Aquilo esquenta, sai fumacinha.
É o momento de olharmos as mulheres peladas (e já sujas) pelas paredes. Calendários dos anos 90 e até oitenta. Mocinhas que hoje já devem ser avós, ali, testemunhas discretas de nossos furos.
Tem também um jornal de esportes do dia por aqui, cheio de impressões digitais. Não dá mais para ler as notícias que ficam à direita e à esquerda da página. Sentar, nem pensar. Agora ele enche de novo a câmera. Mais do que a gente imagina. A impressão é que aquilo vai estourar no nosso rosto. Mas – incrível – não estoura.
Enfia na banheira de novo. Esvazia e enche pela terceira vez. Ao se ajeitar lá dentro, a borracha dá um inesperado estouro e se acomoda. Coloca o bico no lugar. Pega um aparelhinho e vê a pressão. Tudo isso muito rápido, com muita eficiência, sem cursar nenhuma faculdade. Mas você sente que o cara é competente, é pós-graduado.
É aí que ele pega o nosso estepe e balança a cabeça negativamente. Você entende, o estepe está mesmo pela hora da aposentadoria. Negocia ali na calçada enquanto coloca o pneu no lugar. Você acaba comprando outro estepe.
Mas só quando você chega em casa é que você percebe que também está todo sujo, apesar de não sentar e nem encostar  em nada.
E pensa naqueles dois que te salvaram a vida. Admiro estes homens. São meus heróis.
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SOBRE O AUTOR:
Mario Prata é um escritor, dramaturgo, jornalista e cronista brasileiro. É natural de Uberaba, Minas Gerais, mas viveu boa parte da infância e adolescência em Lins, interior de São Paulo. Em mais de 50 anos de escrita, tem no currículo 3 mil crônicas e cerca de 80 títulos, entre romances, livros de contos, roteiros e peças teatrais. Na carreira, recebeu 18 prêmios nacionais e estrangeiros, com obras reconhecidas no cinema, literatura, teatro e televisão. Mario Prata tem três filhos: Antonio, Maria e Pedro. E três netos: Olivia, Daniel e Laura.

TEATRO – Em 1970, Mario Prata estreou no teatro com a peça O Cordão Umbilical, com direção de José Rubens Siqueira. Ainda na década de 70, escreveu E se a Gente Ganhar a Guerra? (1971) e abordou o tema da tortura em Fábrica de Chocolate (1979). Nos anos 80, abusou da paródia em Dona Beja (1980), reviu momentos do teatro brasileiro em Salto Alto (1983), discutiu sobre pecado e prazer em Purgatório, uma Comédia Divina (1984) e sexualidade e tabus em Papai & Mamãe – Conversando sobre Sexo (de 1984, em parceria com Marta Suplicy). Seu maior sucesso nos palcos foi Besame Mucho, peça de 1982, que virou filme premiado cinco anos depoisSua peça mais recente é Eu Falo o que Elas Querem Ouvir, encenada em 2001, com direção de Roberto Lage.

CINEMA – Mario Prata passou a colaborar para o cinema em 1971. Dentre os filmes que roteirizou e escreveu o argumento, estão O Jogo da Vida e da Morte (1971), Chico Rei (1985), Besame Mucho (1987, em parceria com Francisco Ramalho Jr.), Banana Split (1988), Beijo 2348/72 (1991), O Testamento do Senhor Napumoceno (1997) e O Casamento de Romeu e Julieta (2003, com roteiro baseado em um conto do autor).
JORNALISMO – Em começo de carreira, foi repórter na Gazeta de Lins e para o jornal Última Hora. Nos anos 70, colaborou como cronista no Pasquim, ao lado de Millôr Fernandes. Em 1993, passou a assinar uma coluna semanal no jornal O Estado de S. Paulo, onde foi cronista por 11 anos. Também assinou crônicas para diversas publicações nacionais, entre elas as revistas Istoé eÉpoca e o jornal Folha de S. Paulo.

TELEVISÃO – Em 1976, escreveu a primeira novela, Estúpido Cupido, um dos maiores sucessos de audiência na Rede Globo. Escreveu e colaborou ainda nas novelas Sem Lenço, Sem Documento (1977, Rede Globo), Dinheiro Vivo (1979, TV Tupi), Um Sonho a Mais (1985, co-autoria), Helena (1987, Rede Manchete) e Bang Bang (2005, Rede Globo). Dentre as minisséries, telerromances e programas Caso Verdade, estão Xico Rey (1978), O Resto é Silêncio e O Vento do Mar Aberto (1981, TV Cultura), Música ao Longe (1982, TV Cultura), Avenida Paulista, Devolvam meu Filho e O Homem do Disco Voador (1982, Rede Globo) e A Máfia no Brasil (1984, Rede Globo).

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LITERATURA – Sua estreia na literatura foi em 1969, com o texto O Morto que Morreu de Rir. Em 1987, a premiada peça teatral Besame Mucho foi lançada em livro. Explorando gêneros, escreveu e participou de dez coletâneas literárias e da coleção Quem Conta um Conto, projeto adotado em escolas, com organização do professor Samir Curi Meserani. De 1970 a 1987, Mario Prata também escreveu e participou de cinco publicações para o público infantil.
Na década de 90, o autor lançou os seguintes livros para o público adulto: Schifaizfavoire (1993), James Lins, o Playboy que (não) deu certo (1994), Filho é Bom, Mas Dura Muito (1995), Mas Será o Benedito? (1996), Diário de um Magro (1997), 100 Crônicas (1997, peloEstadão), Minhas Vidas Passadas – a limpo (1998) e Minhas Mulheres e Meus Homens (1999).
Em 2000, escreveu inteiramente online o livro Os Anjos de Badaró, o primeiro projeto do tipo no país. Nesta década, lançou Minhas Tudo (2001), Buscando o seu Mindinho (2002), Palmeiras, um Caso de Amor (2002), Diário de um Magro 2 (2004), Paris, 98! (2005), Purgatório – A Verdadeira História de Dante e Beatriz (2008) e Cem Melhores Crônicas – que, na verdade, são 129 (2008). Os livros de Mario Prata estiveram na lista de mais vendidos nove vezes, liderando-a em seis ocasiões. Mais recentemente, o autor tem se dedicado à literatura policial, com dois livros publicados do gênero: Sete de Paus (2008) e Os Viúvos (2010). Sua publicação mais recente é o Almanaque Pinheiro Neto, livro comemorativo lançado em 2012.
https://marioprata.net/sabe-o-mario/

Boa leitura amiguinhos!!!!!

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